sexta-feira, 3 de junho de 2011

A BORBOLETA DE TIA NEIDE

A bORBOLETA de Tia Neide

A bermuda de veludo “cotelê” cor de burro quando foge era horrorosa até que Tia Neide resolveu aplicar uma borboleta de miçangas. A borboleta mais linda que eu já vi na minha vida.

A bermuda, na realidade, não era uma bermuda e sim uma calça Lee que virou uma bermuda.

Naqueles tempos, a roupa era passada da irmã mais velha para a irmã mais nova, em carreirinha. E olha que eram treze! Nove mulheres e quatro homens. Eu me considerava a 14ª. É verdade! Eu achava que antes da minha mãe casar eu era a irmã mais nova, que só me tornei sua filha depois que ela se casou. Acho que nunca falei isso pra ninguém...

Mas, vamos às roupas: assim como as outras, eu também tinha meu lugar na fila. Vivia de olho no farto guarda-roupa das tias.

E como elas tinham roupas!

Afinal, eram oito moças e meu avô fazia questão que elas andassem muito bem vestidas. Elas não repetiam roupa de festa. Era um sonho!

Voltemos à bermuda.

A dona da bermuda era a Tia mais prendada. Costurar, bordar, casear, pintar, decalcar, colar sem deixar manchas no trabalho, enfim... tudo que sei de corte, costura e afins aprendi com ela! Exceto cerzir. Nesse quesito, Tia Lena era campeã! Fazia gosto vê-la usando a máquina Singer de Vóvo Odete, numa velocidade louca, pra frente e pra trás, e em instantes, como por encanto, a costura se transformava num remendo invisível deixando as calças Lee desbotadas aptas para mais uma cavalgada. Os tios viviam rasgando as calças e Tia Lena, as remendando. Perfeitamente. Velozmente. Invisivelmente.

Era tempo dos hippies e as roupas deviam ser reaproveitadas. Além de politicamente correto, era moda! E as filhas de Ninito estavam sempre na vanguarda de tudo.

Naquela época não se falava em customização, mas era isso que fazíamos.

Havia muitas revistas de moda e idéia é o que não faltava naquela casa. O “Clube de Costura” (que era o nome que eu dava àquele movimento, sem ninguém saber, é claro!) funcionava sempre depois do almoço.

Assim que Vovô saia à cavalo, todas nos reuníamos para colocar em prática os nossos dotes: depois de muito folhear os “manequins”, escolhíamos os motivos e os riscávamos nas velhas calças Lee, que se transformavam em verdadeiras obras de arte.

Foram muitos bordados e muitas aplicações, mas como aquela borboleta de miçangas nunca existiu outra mais linda!

É muito provável que aquela bermuda não exista mais, no entanto, aquela borboleta continua viva na minha lembrança e está sempre voando ao meu redor: fagueira, linda e brilhante.

Aliás, aquela borboleta é muito mais do que mera lembrança. Constato eterno o seu verdadeiro significado. A sua profunda representatividade. O poder de transformar o feio e velho em coisa nova e bonita. A possibilidade de SE transformar a cada dia, de renovar o velho e redesenhar a vida, dia após dia, enquanto ela perdurar.

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